16 de fevereiro de 2019

deságuo

pedaços dos meus corpos todos de todos os outros tempos
inalcançáveis
nem sei e uso nem ao invés de não
nem sei mais o que eu quero, e isso é tão normal
tão simples
os lobos me deixam carcaça à terra
carcaça, carrion,
pinga pelos dedos o resto, o que me lembro
quando já entorpecida me vejo escorregar do sofá ao chão
líquida
e deito ali com medo da história da vizinha
que derreteu seu rosto na baba escorrida pelo canto da boca
e por sete dias ficaram ali, os bichos, os vermes, me derretendo a pele
que nem minha é e nem minha foi sequer

me visto de todas as roupas e me vendo barato
roupas brinde
eu nem me mexo mais, deixo escorrer pelas pontas dos dedos
o caminho que fez a lama, antes, pescoço, braços, dedos
agora nascente já por baixo das unhas
deságuo lenta

deságuo
um adeus em todas as janelas