21 de junho de 2018

apêndice

uma face que é suficiente durante esses poucos segundos depois que desperto
do banho eterno de água e ar
e preenchem minha barriga e removem
uma arte só que existe apenas no sofrimento da noite de uma dor sem posições
muita água
as fotos que tirei e a cumplicidade de mãos e lugares e uma segurança que existe só na face que não existe enquanto durmo
uma face de um só rosto
enquanto a segunda dorme
desenho por cima de fotos e ainda que a corrente da água de antes me sugue
e vejo passar muita água como capítulos e páginas de um álbum e água água
sinto o desespero de quem vem para me puxar de volta
e puxa e nunca senti nem medo de me afogar
minha câmera à mão
é muito triste que uma só face exista mesmo existindo mil faces que nos adoecem
é muito triste a dor quando sozinha e o medo
é muito triste as lágrimas que choro escondida logo na possível despedida de mim mesma
como me despedir da única perspectiva possível
certa coisas não consigo entender e me incomodam até que
abandono e me deixo tomar de dor que irradia e desfaz sentidos e origens
de onde vem a dor
de onde vem a despedida
de onde vem a voz
ao redor de mim que me fala coisas que não quero ouvir
para onde foram as lágrimas da minha despedida
e para onde foi aquela de quem me despedi no chuveiro do hospital
e na face de agora há pouco permanecíamos como a face que despedimos
tantas despedidas