9 de março de 2017

Intervalos

I.

em dias em rostos cinzelados
em madeira, espero
sem sentir o vento que risca meu rosto
um dia, querendo morrer, espero chorar
sem sentir o vento que risca meu rosto
um momento que me fez não ser quando
nos juntamos para não existir
já não me lembro e não há, há, documentos
que provem, tudo se deteriora, tudo?
eu, às loucas, espero que sim
e que sobre apenas ruínas e nossos pedaços voando por todos os lados
podendo dizer, digo, e me nego depois
que a mesma voz, o significado
direcionado a mim
nos juntamos para não existir

não me lembro mais que posso morrer
para não acordá-lo em desespero
não dizer não percebe que morro
não percebe que o filme será tido em meio?
a celulose queima em círculos e aguardo fechar-me os olhos
não conte a meus pais, não conte,
quando tiver morrido, que eu o amava
qual lágrima desceria o rosto dos que soubessem
que não sinto nada
minha primeira lágrima ainda espera o retorno
e ouço a voz que imita a minha, que imito,
sólida,
sólida, a ária preenche os espaços vazios dentro de mim,
entre ossos, o espaço que hesita o encontro,
afundo pedra maciça, e em meio aos ossos de dEUs
dormirei
talvez um dia
eu mãos dadas e ele no inferno

espero o testemunho que me afirme a dança de corpos a sós


II.

lobos carregam meus ossos a ele e os alinham no chão a sua frente
uivos me dizem a dor que não sinto, não sei,
lobos me levam a lugares, antes, onde ele não está
mas sei onde está,
sei todos os espaços, quase todos, os espaços, que ocupa
espero os lobos me levarem a ele


III.

nenhuma marca por entre pele, entre peles
espaços que se preenchem de dEUs
e dEUs não existe há um tempo enquanto não o vejo
não à transgressão da respiração que chega ao meu rosto
arranque cada um dos dedos, um por mim, minha mão direita
anéis dedos sem fim , sem bordas, sombras constituídas
de uma mesma escuridão, sombra
me alimento de um dia e não me ouço
você tem flor de maio em casa?
eu sinto seu receio em mim, dentro de mim corre a dúvida
e me consome


IV.

nossos ossos todos no escuro
respiramos apenas no escuro
eu você e o espaço entre nós


V.

ópera só interlúdio


VI.

sou todos os peixes
e antes os que se asfixiam na margem
margem seca que não toca a água
sou antes eles
observando meu último cenário
num último fôlego
metade terra, metade o céu e está tudo muito escuro
está tudo muito escuro enquanto sinto um último toque
ou primeiro toque,
uma experiência que é sempre a primeira e a final
não há nada além do toque
não há nada além de um pensamento em comum
as nuvens de fumaça começaram em uma
sem uma noite de incêndio