16 de dezembro de 2016

quarto 506 - quarto 187

sete vezes
tento enxergar o outro lado de fora da janela
como se ainda houvesse alguma coisa fora afora
e sem conseguir sete vezes o mesmo osso bate no vidro
o mesmo osso setes vezes depois a parede falsa
se apoia todo dia, uma outra vez para determinar a cor
da pele por baixo sangue, emerge a cor que evito
antes da última vez o mesmo osso à parede
antes o vidro, mas não posso enxergar no outro lado
aqui está embaçado e tento me lembrar os nomes
riscados no muro, na esquina, estou em outra cidade
procurando as coisas que deixei cair outro dia

sete vezes se foram eu me vejo partir, malas à mão
qualquer lugar, quero ir para qualquer lugar
eu sei o espaço do desconhecido e ando com mãos livres
                                                                        malas à mão
pela cidade que não conheço virando esquinas
que não deveria
queria ser parte do que desmorona e me deixa porta
fora
eu não tenho nada - ao redor posses livros discos
não tenho nada e ando nua pelas ruas das cidades que não conheço
acordo abrindo os olhos para janelas coladas no cinza
e cinzas mancham meu vestido azul meu vestido preto
ando nua sinto frio
como entra o ar por entre prédios como entra o ar por entre dentes cerrados
sinto raiva e sinto frio e me sinto só

cáries assumem espaços entre meus dentes
não assumo espaços em parte alguma
não moro dentro do meu quarto ou dentro de qualquer coisa
e não conheço as ruas dessa ou daquela cidade ou
de qualquer outra – e limpo as cinzas e os restos
de relva que trouxe no sapato
sempre sinto fome agora sempre
sempre sinto fome desde então quando decidi que seria algo a mais
que faria parte de algo que desmorona

os meninos passam pela rua e observo seus rostos limpos
meus vícios não me constroem mais
não vejo um que respire por tempo o suficiente
ou que diga algo antes da minha própria voz
planaltina belo horizonte são paulo
brasília
meus vícios não me conhecem mais
canto a ária