7 de novembro de 2016

Só eu

                                                                             "Só eu não durmo
                                                                              Pra te pensar"
                                                                                                (Hilda Hilst)

Há do outro lado do vidro pessoas que 
Fascinam em medo sentindo como se
traço do gume à pele e
Observam, seus olhos todos vários abertos
Mas só eu sinto o traço (e não durmo)
acho que sinto ou só vejo escorrer o sangue
E eu continuo acordada apesar de
E faria sentido se
Apesar se                                             e o mel
A morte vem em pequenas mordidas
E não sinto dor a princípio, mas até quando
Vou poder olhá-la como se de cima e rir
Das tentativas, ao passo o corpo encolhido no colchão
Eu não durmo no canto do quarto vazio do quarto de hotel
Vazio eu não durmo e não acordo com os olhos estranhos (em mim)
Não sorrio, essa não sou eu, ou o outro que observa, ou os dois
Deixo de dormir essa noite e carrego os medos dos outros
Eu não sinto nenhum medo a não ser o de perder os dedos
Ou de precisar explicar as marcas no meu braço direito
Eu não sei sinceramente o que significam as linhas e estrias
Deixo de dormir essa noite e guio minha não existência à nostalgia
Eu digo que não existo e o pensamento é ainda anterior a isso
Eu digo, mas antes já passei por todas contradições e as evitei
De forma tão negligente, como evito sentir as pequenas mordidas,
É tão carregada a voz, há tanto que não se ouve, mas ainda assim
Pronuncio duas vezes e não sei, não sei como ainda digo ou
Se ainda ouvem ou apenas sons misturados por trás de mim
Deixo de dormir essa noite, desde então, entre decisões banais
Se envio ou apenas escrevo profecias à parede e observo de longe
No escuro, sem ver realmente, a memória escrever ainda mil vezes
Não tem mais , fim , de onde estamos , para , eu procuro outros jeitos de .
As pequenas mordidas parecem mais claras à noite
E ainda assim só eu
Não me importo de ver ir embora ainda que sete vezes como na infância
Me diziam seu avô morreu, seu tio morreu, sua avó morreu,
O irmão morreu, seu pai morreu, dona Ilda morreu
, e escuto isso
Entre sessões de brinquedos que não fazem mais sentido
Não escuto mais nada, as mordidas mais doloridas à noite
Seus dois filhos sexta entram de férias
E se beijam, os brinquedos, ainda que arremessados para debaixo da
Há algo de errado
Não onde estão olhando
cama, e ninguém os viu